A Semana Santa 2024 foi vivida em pleno na Catedral de Évora, assim como por toda a Arquidiocese.

Neste Sábado Santo, dia 31 de março, pelas 21h30, na Catedral, D. Francisco José Senra Coelho presidiu à Solene Vigília Pascal, que foi concelebrada pelo Arcebispo de Évora emérito, D. José Alves, por alguns cónegos do Cabido da Catedral eborense, por vários presbíteros, servida por alguns diáconos e contou com a presença de consagrados e consagradas da Arquidiocese, e com os seminaristas dos Seminários da Arquidiocese.

A Solene Vigília Pascal, animada liturgicamente pelo coro Stella Matutina e transmitida em direto pelos canais digitais da Arquidiocese de Évora, numa produção do Departamento de Comunicação com o apoio da Comunidade Canção Nova de Évora, contou com a presença de muitos fiéis que encheram a Catedral eborense.

A Vigília das vigílias começou na escadaria da Catedral, com a bênção do lume novo.

À homilia (ler abaixo na íntegra), o Prelado eborense começou por dizer que “a morte foi vencida. Hoje, começa uma nova criação. Hoje, recebemos um novo sopro de vida, a ressurreição de Jesus Cristo é sempre dita no presente, é sempre actual, ultrapassa as limitações do espaço e do tempo, é meta-histórica, enche a História Universal de um novo significado, uma experiência pascal que designamos de salvação (eterna).”

“Importa que nos deixemos surpreender pelo anúncio pascal. Contemplemo-lo como se fosse a primeira vez”, apelou o Arcebispo de Évora.

“Jesus Cristo foi ressuscitado pelo poder do Pai e pelo Espírito Santo. O baptismo e a eucaristia tornam-nos participantes da Vida Nova da Páscoa. Somos homens e mulheres ressuscitados, vivendo com todos, porém com critérios e valores diferentes face a muitos aspectos da vida, afinal fruto da Vida Nova recebido na fonte baptismal e mantido na Eucaristia”, explicou o Prelado.

“A fé é pascal, ou seja, propõe-nos a inteira unificação de todas as dimensões da vida. A nossa meta, desde agora, é a plenitude da vida, a vida eterna, de modo que, desde o Batismo nos é proposto viver como homens e mulheres ressuscitados por dentro, com este gérmen de vida nova. Para os Cristãos a morte, todas as mortes e renúncias ou sacrifícios de vida, valem pela força do Amor que venceu a morte. Por isso, vale sempre dar a vida e amar sempre porque a vida e o Amor são as palavras finais da História!”, sublinhou D. Francisco Senra Coelho.

“A experiência pascal é uma experiência comunitária, nunca uma experiência apenas individual. O anúncio pascal faz de nós Igreja em saída, que mostra o rosto novo de uma mãe com o coração aberto para todos”, sublinhou o Arcebispo de Évora.

“Vem, Senhor Jesus, permanece connosco, para que Te mostremos na Tua beleza ao mundo que afinal Te procura”, concluiu a homilia D. Francisco Senra Coelho.



HOMILIA DA VIGILIA PASCAL

30 – III – 2024

1. A morte foi vencida. Hoje, começa uma nova criação. Hoje, recebemos um novo sopro de vida, a ressurreição de Jesus Cristo é sempre dita no presente, é sempre actual, ultrapassa as limitações do espaço e do tempo, é meta-histórica, enche a História Universal de um novo significado, uma experiência pascal que designamos de salvação (eterna).

Jesus não viveu uma ressuscitação como Lázaro, que ressuscitou para o tempo e para o espaço, na contingência do tempo que envelhece e do espaço que limita. Ele ressuscita para uma vida nova, uma vida diferente, uma vida no Espírito, a vida do corpo glorioso. Essa vida que chegou até nós pelo baptismo em gérmen e fonte de ressurreição que em nós permanece. Fonte de ressurreição capaz de nos fermentar, levedar e transformar.

O mistério cristão de salvação possui, como acreditamos e sabemos, uma ligação umbilical com o acontecimento pascal. Esta constatação, que, entre nós, até pode parecer óbvia, precisa de ser recordada com frequência, geração após geração, para não fazermos do cristianismo somente uma ideia filosófica, uma ideologia, mais ou menos ajustada às coisas da terra, mas experimentemos o Dom da Vida Nova através do encontro íntimo com o Ressuscitado. Porque o mistério pascal é a base e a coroa da nossa salvação, é nele que nos refazemos interiormente, renascendo na nossa liberdade interior, pois o Seu Amor por cada um de nós é sem limites. Amor que não nos permite ter medo. Amor e liberdade é isso mesmo, não ter medo.

Importa que nos deixemos surpreender pelo anúncio pascal. Contemplemo-lo como se fosse a primeira vez. Contemplemo-lo com espanto, com capacidade de contemplação. Olhemos para ele com essa capacidade que só nós temos de olhar para longe, muito longe, sem nada que nos tolha a liberdade e vermos o sol que nasce na festa crepuscular da madrugada, na festa das luzes do céu. Contemplemo-lo na beleza da pureza da verdade cristalina.

2. O Evangelho não narra a Ressurreição como um momento cronológico, uma vez que apresenta apenas os sinais do túmulo vazio e da explicação angélica para o que aconteceu, bem como a missão que isso acarreta para a vida dos cristãos que se encontram com esta nova realidade. Lucas pretende levar os seus leitores a fazer precisamente o mesmo caminho das mulheres; a cruz e a sepultura de Jesus conduzem necessariamente ao lugar onde Ele ficou depositado; é verdade que, várias vezes, Jesus tinha falado em ressurreição, mas os discípulos não compreendiam o significado de tais palavras (cf Lc, 18-34). Lucas identifica os mensageiros como «dois homens com vestes resplandecentes» (Lc 24, 4; cf 9, 29). Esta característica leva-nos à transfiguração no Tabor, serve ao evangelista para demonstrar a origem divina da mensagem: só Deus pode dar resposta à perplexidade humana diante da morte. À ressurreição de Jesus chega-se pelo anúncio e não pelo exercício dedutivo da razão humana. Assim acontecerá com Pedro e com os discípulos de Emaús que reconhecerão Jesus pelo anúncio e pelos sinais da sua presença (cf. Lc 24,13-35.36-49).

Jesus Cristo foi ressuscitado pelo poder do Pai e pelo Espírito Santo. O baptismo e a eucaristia tornam-nos participantes da Vida Nova da Páscoa. Somos homens e mulheres ressuscitados, vivendo com todos, porém com critérios e valores diferentes face a muitos aspectos da vida, afinal fruto da Vida Nova recebido na fonte baptismal e mantido na Eucaristia. Deste modo, podemos dirigir o coração para os Céus: “aspirai às coisas do alto (…) Afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra”. Ao aceitarmos esta realidade essencial da nossa fé baptismal – que hoje dentro de momentos iremos renovar – tornamo-nos aspirantes às coisas do alto, às realidades espirituais e divinas; aos critérios de Deus, às bem-aventuranças, ao mandamento novo, a uma outra dimensão da vida mas que dá sentido a esta nossa vida aqui no tempo e neste mundo. A linguagem pode ser equivoca, pois não estamos a separar em modo dualista as coisas da terra e as coisas do alto. Não são mundos opostos ou mutuamente excluídos. A fé é pascal, ou seja, propõe-nos a inteira unificação de todas as dimensões da vida. A nossa meta, desde agora, é a plenitude da vida, a vida eterna, de modo que, desde o Batismo nos é proposto viver como homens e mulheres ressuscitados por dentro, com este gérmen de vida nova. Para os Cristãos a morte, todas as mortes e renúncias ou sacrifícios de vida, valem pela força do Amor que venceu a morte. Por isso, vale sempre dar a vida e amar sempre porque a vida e o Amor são as palavras finais da História!

Assim, somos frutos da Páscoa, porque fomos mergulhados nas águas do baptismo, porque estamos confirmados pelo dom espiritual mais sublime, e temos acesso a todos os demais Sacramentos, sobretudo porque somos alimentados pela Eucaristia, o pão para um mundo novo que construiremos na nossa coerência, dedicação e sinal profético na mensagem da nossa vida. A presença viva do Ressuscitado está no mundo connosco e por meio de nós. A experiência sacramental é sempre uma realidade pascal. Como diz S. Leão Magno: “O que no nosso Redentor era visível, passou para os seus sacramentos” a sua corporeidade permanece no mistério de cada sacramento, permanecendo os seus efeitos invisíveis. É a nossa participação no absolutamente outro da Vida Nova, que nos faze encontrar Cristo, alimentar-nos de Cristo, vivermos do mundo sem ser do mundo, sendo, porém, do tempo.

Por isso, celebramos o núcleo da nossa fé: Cristo vive; e quer-nos vivos! Assumidamente vivos na nossa cidadania com uma vida que brilha, transparece e testemunha. Nele se fazem novas todas as coisas: a luz, a água, o pão, o vinho, a mesa compartilhada, a alegria renovada e a esperança presente em todos os corações. Afinal em cada um dos sacramentos, na Eucaristia a plenitude aonde nos encontramos com o Senhor ressuscitado de modo pleno. Há de ser esta transformação através de cada um de nós, pedras vivas da Igreja sacramento do mundo que há de também transformar o mundo.

A experiência pascal é, porém, uma experiência que transcende o privativo, o íntimo. Se o é transcende-o pela experiência comunitária. Nunca uma experiência quando atinge a profundidade do coração humano permanece apenas individual. Perante a beleza, perante o fascínio, perante o encanto não cabemos em nós, anunciamos, compartilhamos, dizemos a quem amamos a descoberta que fizemos, eis a força do encontro com a beleza. Eis porque a beleza salvará o mundo.

O anúncio pascal faz de nós Igreja em saída, que mostra o rosto novo de uma mãe com o coração aberto para todos. O “nós” sinodal, proposto pelo Papa, impele-nos a festejar a fé a partir da comunicação do “nós” eclesial. Esta espiritualidade do “nós” remete-nos para a caminhada sinodal em curso na Igreja Católica e para a dinâmica pós-JMJ com os nossos jovens. É com esta alegria que na perene juventude do Cristo Ressuscitado, caminhamos na Páscoa, pois “Se alguém está em Cristo, é uma nova criatura; as coisas antigas passaram e tudo foi renovado” (2Cor 5, 17). Somos nós a novas criaturas. Somos nós a presença da Páscoa do mundo. Somos nós testemunhos da esperança. Somos nós em quem Cristo deposita a sua esperança. É em nós que Ele acredita.

Senhora Nossa e Mãe do Ressuscitado, permanece connosco em Cenáculo e ensina-nos a confiar, para que certos das promessas do mestre, tenhamos a alegria de viver contigo a manhã de Pentecostes que chegará aí daqui a 50 dias.

Vem, Senhor Jesus, permanece connosco, para que Te mostremos na Tua beleza ao mundo que afinal Te procura.

+ Francisco José Senra Coelho

Arcebispo de Évora

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