O chefe de projectos da Fundação AIS na Venezuela fez recentemente uma viagem por 11 dioceses para perceber quais são as maiores dificuldades que se colocam à vida da Igreja neste país que tem vivido tempos de forte convulsão social e política. O resultado é encorajador. A Igreja está viva, unida e alegre apesar das [muitas] dificuldades.
“Existe uma situação de pobreza muito grave.” A observação é de Luis Vildoso, responsável de projectos da Fundação AIS. Após uma viagem que o levou até 11 dioceses, situadas no centro e oeste do país, Vildoso mostra-se entusiasmado e preocupado. Entusiasmado, por constatar que a Igreja está viva, unida e alegre, com uma forte participação e empenho por parte dos mais jovens. Mas preocupado, por ter encontrado um país pobre e um regime que continua com uma atitude repressiva e controladora, o que é visível em diversos sectores da sociedade, nomeadamente na comunicação social. No entanto, há espaço para optimismo. A solidariedade da comunidade cristã para com os seus padres foi uma das imagens que Luis Vildoso trouxe consigo, num país onde a pobreza convive paredes meias com a exuberância. “A Venezuela tornou-se um país de contradições. Apesar da crise económica e social, assistimos recentemente à abertura de casinos e concessionários de automóveis de luxo, como a Ferrari, bem como pistas de karting, um novo estádio moderno de basebol e até novas clínicas privadas. No entanto, tudo isto está reservado aos que estão ‘ligados’, àqueles que de alguma forma estão relacionados com o regime actual”, afirmou o responsável de projectos da AIS.
Um país, duas realidades
Os baixos salários, que impedem uma vida com um mínimo de desafogo e dignidade, é também uma imagem incontornável da Venezuela em 2023. A pobreza, que é comum à esmagadora maioria dos venezuelanos, choca com a riqueza que alguns ostentam por estarem próximos do regime de Nicolás Maduro. “Um trabalhador do sistema público de saúde ou da educação, por exemplo, ganha cerca de 5 ou 10 euros por mês, mas o custo de vida médio para uma família de cinco pessoas é de cerca de 180 euros por mês. Além disso, a indústria, em geral, ou está paralisada ou está significativamente esgotada, tal como a indústria petrolífera, que está a operar abaixo dos níveis mínimos de produção”, diz o responsável de projectos da Fundação AIS. A par disto, Vildoso destaca também as condições precárias de vida que encontrou nos subúrbios das grandes cidades, nomeadamente na capital, Caracas. “Fiquei impressionado com os níveis de sobrelotação em áreas como Petare, na periferia de Caracas. À medida que se caminha pelas ruas existem pequenas vielas que levam a outras casas, todas cheias de pessoas. Vi um edifício que tinha cerca de 10 ou 12 andares; embora estes não sejam tantos edifícios, mas estruturas, construídas umas sobre as outras, sustentadas por pilares que só parecem permanecer de pé por milagre. Não há uma contagem oficial, mas diz-se que cerca de dois milhões de pessoas estão apinhadas nesta área.”
Um povo solidário
A visita às 11 dioceses da Venezuela permitiu um contacto estreito com a Igreja local, com as comunidades de base, as paróquias, movimentos. Vildoso descreve uma Igreja viva, unida e alegre que enfrenta uma luta difícil. “Encontrei uma Igreja muito viva, muito unida e alegre, apesar do facto de enfrentar uma luta difícil. Pode ver-se que Deus está presente, sustentando a comunidade. Ele é a sua força. Da perspectiva social, a Igreja desenvolve muitas iniciativas nos domínios da educação e da saúde. Além da ajuda material, os Católicos também recebem apoio espiritual através de uma série de actividades. Fiquei muito emocionado ao ver como os leigos estão comprometidos com a Igreja. No meio da pobreza, o povo mostra-se solidário com os seus padres, colocando os seus veículos, os seus conhecimentos e a sua experiência à disposição dos seus pastores para organizar iniciativas pastorais. Todos, ricos ou pobres, contribuem de acordo com os seus meios.”
Falta de sacerdotes
Esta solidariedade de que fala o responsável de projectos da Fundação AIS é tanto mais importante quanto a Igreja enfrenta também uma escassez de sacerdotes, especialmente os estrangeiros, que é consequência directa das dificuldades burocráticas que as autoridades colocam, por exemplo, nas renovações das autorizações de residência. “Em alguns lugares há escassez de sacerdotes. Muitos sacerdotes e religiosos estrangeiros tiveram de abandonar o país porque as suas autorizações de residência não foram renovadas”, explica Luis Vildoso. Podemos ver nestes episódios um sinal de perseguição à Igreja? “O controlo do Governo sobre a população em geral é muito claro, especialmente através das ‘alcabalas’, que são pontos de controlo onde há sempre um polícia de vigia, por exemplo, nas estações de serviço”, explica o responsável de projectos. “Os meios de comunicação social também são controlados. Ao controlar a população, em certa medida o Governo também controla a Igreja. O Governo tem, ocasionalmente, atacado a Igreja. Recentemente, alguns dias após a celebração da Missa, um padre recebeu uma carta do Governo, dizendo: ‘Este foi o seu sermão’! Até certo ponto, a Igreja está sitiada”, conclui.
Alegria dos jovens
Apesar de tudo isto, apesar da repressão, da pobreza, da falta de sacerdotes, há sinais que permitem olhar para a Igreja na Venezuela com algum optimismo. E a participação dos jovens na vida comunitária não é alheia a isso. “O Bispo da Diocese de San Carlos Cojedes convidou-nos para uma reunião de jovens, mas não tínhamos ideia da sua dimensão. Quando chegámos, fomos recebidos por 500 jovens, em diálogo com o bispo, fazendo-lhe perguntas muito interessantes, e eles convidaram-nos a juntar-nos a eles. Quando parti, senti-me renovado na minha missão”, recordou Luis Vildoso, que esteve também na Diocese de Acarigua Araure. A experiência foi semelhante. “Fomos a outro encontro de jovens com o seu bispo, para discernimento vocacional. Encontrámos uma igreja cheia de jovens. Quem nos dera que as igrejas na Europa também fossem assim! A Igreja na Venezuela é muito latino-americana, muito animada, muito alegre.”
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