A Igreja Católica de Moçambique está “comprometida intensamente” na promoção de soluções para o fim da violência que tem assolado o país desde Outubro de 2017, quando ocorreram os primeiros ataques terroristas. O Padre Eduardo Roca, que lidera, na diocese de Pemba, o Centro Inter-religioso para a Paz, diz, à Fundação AIS, que é preciso “ajudar a desradicalizar um pouco a mentalidade” …

A Igreja Católica tem assumido, nos últimos tempos, um papel discreto, mas convicto, num processo de negociações que possa efectivamente conduzir ao fim da violência terrorista em Moçambique. O Pe. Eduardo Roca, que está desde 2012 em Mahate, na Diocese de Pemba, e que criou em 2017 o Centro Inter-religioso para a Paz, acompanha este processo e, em declarações em exclusivo à Fundação AIS, reafirma o propósito de a Igreja Católica poder contribuir de forma decisiva para o sucesso desta iniciativa. “A Igreja Católica está não só preocupada, está engajada, está comprometida intensamente e a qualquer preço pelas negociações pela paz”, diz o sacerdote, esclarecendo que este compromisso existe “não apenas ao nível religioso, mas também ao nível académico e ao nível das comunidades locais”. As palavras deste sacerdote são significativas até porque ocorrem numa altura em que circulam notícias de que haverá vontade, em alguns sectores da sociedade moçambicana, em promover canais de diálogo que possam ajudar a levar ao fim da violência armada. A Igreja Católica desempenha um papel único neste contexto, pois está presente e está em contacto permanente com as populações mesmo as que vivem nos lugares mais pequenos e distantes. Este é um património único para quem deseja efectivamente ajudar a construir a paz, a lançar pontes, a fomentar o diálogo. “Estamos incentivando agora grupos inter-religiosos com os padres de cada paróquia, e estamos também a levando aos distritos do Norte formação para o diálogo inter-religioso e depois provocando muitas pontes para que as pessoas possam chegar e dialogar e encontrem um espaço onde possam fazê-lo com segurança”, explica o Pe. Eduardo Roca.

“Desradicalizar mentalidades”

Este compromisso da Igreja pela paz em Moçambique, pelo fim da violência terrorista, está em marcha, apesar de muito discreto. “Agora, na segunda quinzena de Julho, e em Agosto e Setembro, vamos ter encontros em Palma, Mocímboa da Praia e Macomia com umas 50 lideranças religiosas de organizações muçulmanas e cristãs para divulgar o ‘Documento sobre a Fraternidade Humana em prol da Paz’, assinado em Abu Dabhi pelo Papa Francisco e pelo Grão Imane de Al-Azhar”, disse ainda o pároco de Mahate, um bairro que é uma verdadeira favela e que foi o local onde nasceu a insurgência que transformou Cabo Delgado numa zona de guerra. O bairro, que se estende ao longo de uma estrada poeirenta, é o retrato da pobreza da região e é também o coração do Islão na cidade de Pemba. Conhecedor profundo desta realidade, o Pe. Eduardo Roca diz ainda, nesta declaração à Fundação AIS, que é preciso “trabalhar com as comunidades locais, sobretudo com o objectivo de ajudar a desradicalizar um pouco a mentalidade”. E acrescenta: “Há uma mentalidade espalhada por estas lideranças que, afinal de contas, são as que trouxeram ideias violentas em ligação com a fé muçulmana. Estamos a trabalhar neste sentido e com certeza que estamos dentro e se calhar somos os que estão mais dentro de todas as instituições e das presenças religiosas aqui na província”.

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ACN Portugal · Cabo Delgado | Igreja Católica assume estar ‘comprometida’ no processo de paz

“Deus nunca apoia a violência”

A informação de que a Igreja Católica está efectivamente empenhada num processo pela paz em Cabo Delgado, vem ao encontro da Nota Pastoral dos Bispos de Moçambique publicada em Novembro do ano passado. Nessa Nota referia-se precisamente a importância do diálogo para o fim da violência terrorista no país, em vez do uso exclusivo da força militar. “Devemos juntar todos os esforços para encontrar os caminhos de solução a esta desgraça, não confiando unicamente no uso da força militar. A todos os envolvidos nesta guerra queremos recordar as palavras do Papa Francisco: ‘O Deus da paz nunca conduz à guerra, nunca incita ao ódio, nunca apoia a violência. E nós, que cremos nele, somos chamados a promover a paz através de instrumentos de paz, como o encontro, pacientes negociações e o diálogo, que é o oxigénio da convivência comum’.”

Lembrar a Irmã Maria de Coppi

Os ataques terroristas que têm espalhado medo e morte em Moçambique, nomeadamente nas províncias de Cabo Delgado, Niassa e Nampula tiveram início em Outubro de 2017. Até ao momento, já terão morrido cerca de 4 mil pessoas e há mais de um milhão de deslocados. Na referida Nota Pastoral, os Bispos recordam o assassinato da Irmã Maria de Coppi, uma religiosa italiana que dedicou grande parte da sua vida a Moçambique e falam também num “sofrimento inaceitável” que impede a população de viver em paz. “São semeadas destruições e mortes violentas de crianças, mulheres e homens inocentes e pessoas de boa vontade como foi a Irmã Maria de Coppi, assassinada a 6 de Setembro último, no ataque à Missão Católica de Chipene, Diocese de Nacala. A continuação deste desumano sofrimento é inaceitável e frustra o sonho de sermos uma nação de paz, concórdia e independente, justa e solidária”, escreveram os prelados moçambicanos em Novembro. Agora, meio ano depois, sabe-se que a Igreja já passou das palavras aos actos.

PA | Departamento de Informação da Fundação AIS |

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