Sábado, 19 de Novembro, uma procissão católica, com dezenas de fiéis, em que um grupo de mulheres fazia transportar uma cruz pelas ruas de Masaya, uma cidade no sul da Nicarágua, foi interrompida pela polícia forçando todos os fiéis a retornarem à Igreja de El Calvario.
Este incidente já não foi catalogado na edição actualizada do relatório “Nicarágua: uma Igreja perseguida?”, da responsabilidade da advogada e investigadora Martha Patricia Molina, e que tinha sido divulgado apenas alguns dias antes.
Segundo esse relatório, houve, no período entre Abril de 2018 e Outubro deste ano, 396 ataques contra a Igreja Católica neste país da América do Sul. Isso significa um aumento de 206 incidentes face ao primeiro relatório, divulgado em Maio deste ano.
Entre as quase quatro centenas de episódios documentados, há relatos de profanações, roubos, ameaças e discurso de ódio. Durante este período, foram vários os bispos, padres, irmãs e leigos visados pelas autoridades.
Será necessário, no entanto, salvaguardar a real dimensão desta situação, pois o número de incidentes poderá ter sido maior do que aquele que está registado no estudo, pois tem havido poucas denúncias ou mesmo a falta de divulgação das que, entretanto, ocorreram.
O relatório de Martha Molina, a que a Fundação AIS teve acesso, assegura que no período em análise houve pelo menos 396 ataques contra a Igreja católica, sendo que, destes, 127 foram registados já no decorrer deste ano. Só como termo de comparação, no ano passado houve 54 incidentes envolvendo de alguma forma a Igreja na Nicarágua.
O clima de perseguição e de abuso de direitos humanos provocou já a fuga, também, de mais de 150 mil pessoas. São refugiados e estão, na sua maioria, na vizinha Costa Rica.
“No contexto da repressão estatal de protestos sociais, pelo menos 355 pessoas morreram; mais de 2.000 pessoas ficaram feridas; mais de 1.614 pessoas foram presas; centenas de profissionais de saúde foram arbitrariamente despedidos; mais de 150 estudantes universitários foram injustificadamente expulsos; e mais de 150.000 pessoas foram forçadas a fugir do país e a procurar protecção internacional na Costa Rica, de acordo com dados do ACNUR”, pode ler-se no Relatório.
O trabalho de Martha Molina permite fazer um retrato pormenorizado do estado a que chegou a Nicarágua face ao abuso sistemático de direitos humanos. “Hoje , estudantes, camponeses, médicos, professores, padres, freiras, seminaristas, jornalistas, advogados, leigos da Igreja Católica e defensores dos direitos humanos são criminalizados pelo sistema de justiça do país e, como consequência, à data da publicação deste estudo, há 2194 prisioneiros políticos e milhares de cidadãos forçados ao exílio.”
Toda esta violência, teve um dos momentos mais preocupantes com a prisão, em 19 de Agosto deste ano, do Bispo de Matagalpa. A prisão de D. Rolando Álvarez representou, como denunciou então Regina Lynch, directora de projectos internacionais da Fundação AIS, “uma nova escalada numa espiral de confrontação”. “Estamos a assistir a uma tentativa de silenciar a Igreja na Nicarágua. E não há uma solução fácil. Precisamos de apoiá-los tanto quanto possível. Temos de rezar para que possa haver uma solução pacífica e não um aumento adicional das hostilidades”, acrescentou a responsável da Ajuda à Igreja que Sofre.
O Bispo Álvarez, que além de ser o Bispo da Diocese de Matagalpa é também Administrador Apostólico da Sé Vacante da Diocese de Estelí, está em prisão domiciliária, perto de Manágua, com uma guarda policial constante. Três outros padres, um diácono, dois seminaristas e um fotógrafo também foram presos juntamente com ele e estão no famoso centro de detenção El Chipote em Manágua, onde os prisioneiros políticos são regularmente detidos.
A onda de violência das autoridades sobre a Igreja Católica teve também outros momentos de grande tensão, como, por exemplo, quando foi expulso o Núncio Apostólico, em Março deste ano, ou quando se verificou o encerramento do canal de televisão da Conferência Episcopal e de outras oito estações de rádio católicas. Também este ano, o governo da Nicarágua expulsou as Missionárias de Madre Teresa de Calcutá…
PA | Departamento de Informação da Fundação AIS