Três cristãos foram decapitados por terroristas em Moçambique um dia após o ataque brutal à missão católica em Chipene. A revelação é de D. Alberto Vera, Bispo de Nacala, numa conferência promovida pela Fundação AIS Internacional.
“Os terroristas estavam vestidos com uniformes militares e reuniram a população como se fosse um comício popular. A população apareceu, o motivo era salvá-los dos terroristas. Quando começou o comício, os terroristas perguntaram logo quem eram os cristãos e quem eram os muçulmanos. E aos que se identificaram como sendo cristãos ataram-lhes as mãos atrás das costas. E naquele momento, começaram a degolá-los… Um, dois, três…”. Foi assim que prelado descreveu este ataque, explicando que os terroristas porque envergavam uniformes militares terão confundido as populações. Um dos cristãos da aldeia, que logrou escapar, é que contou a história.
Segundo D. Alberto Vera, tudo isto ocorreu entre nas horas seguintes após o ataque à missão em Chipene, que ao princípio da noite de 6 de Setembro. “Houve um total de 11 pessoas mortas”, esclareceu ainda o Bispo de Nacala, acrescentando que os terroristas “deixaram um rasto de destruição e muito medo”. Só numa das aldeias por onde passaram, os terroristas queimaram 189 casas e a escola. “E também a capela católica.”
O prelado explicou que em toda a região se vive agora um clima de insegurança e que “a zona costeira é considerada como zona vermelha”, ou seja, perigosa. “As ONG’s pediram aos seus colaboradores para saírem.” Sobre os autores dos ataques, D. Alberto afirma que “o problema vem de fora” e que não se pode falar, com propriedade, de “uma dimensão religiosa neste conflito”.
Isto, apesar de, lembrou ainda D. Alberto Vera, o Daesh, ou seja o grupo jihadista Estado Islâmico, ter vindo, com frequência, a assumir a autoria de muitos dos ataques em Moçambique. “Os que têm a agenda islâmica fundamentalista vêm geralmente de fora, são estrangeiros. Eles estão a construir mesquitas e a criar confusão entre os muçulmanos. Em Nacala, existem pelo menos quatro grupos diferentes de muçulmanos que são marcadamente diferentes. Os verdadeiros muçulmanos sentem-se unidos com os cristãos e vivem lado a lado”, disse ainda o bispo.
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Sobre o ataque brutal à missão de Chipene, em que foi assassinada a tiro a religiosa italiana Maria de Coppi, de 83 anos de idade, e mais duas pessoas, D. Alberto lembrou o perfil generoso da irmã, que dedicou praticamente seis décadas da sua vida ao povo moçambicano. “Eu conhecia-a e posso dizer que ela era a imagem de uma mãe, de uma santa. Ela estava realmente a ajudar toda a gente, com amor simples e humilde”, afirmou, acrescentando que se vai abrir “um processo” de forma a se apurar se este é um caso de martírio, como, por exemplo, D. António Juliasse, Bispo de Pemba, já admitiu, também em declarações à Fundação AIS.
Alguns dias depois do ataque à missão, D. Alberto Vera deslocou-se até Chipene, não só para ver a dimensão da destruição causada, mas também para se reencontrar com os responsáveis da comunidade e com as populações locais. A esperá-lo estavam mais de mil pessoas, não só cristãos, mas também muçulmanos. “Foi comovente”, diz o Bispo. “Foi como se mil pessoas te dessem, ao mesmo tempo, um abraço silencioso. Para mim, foi muito comovente. Quando estava a falar, penso que nem sabia bem o que estava a dizer…. estava muito comovido. Que disse? Pois disse que temos de ter fé e esperança e temos de caminhar unidos, caminhar todos juntos, muçulmanos, cristãos, todos. Porque se não caminharmos juntos a guerra não vai acabar, a fome não vai acabar, a pobreza não vai acabar, e daremos um passo em frente, mas cinco para trás.”
Sobre o trabalho da irmã, o Bispo de Nacala recordou que ela era enfermeira, dedicava-se muito a crianças e bebés subnutridos e que isso era visível até num pequeno quarto, na missão, onde guardava para eles leite e farinha.
A violência deste ataque, com o assassinato cruel de uma religiosa octogenária, não foram actos fortuitos. Para o Bispo, há uma mensagem real que importa ter em conta. “Estão a dizer-nos muito claramente que não nos querem lá. Não vamos voltar à missão por agora, mas continuaremos a trabalhar com as pessoas de lá”, disse ainda D. Alberto Vera, que terminou a conferência organizada pela Fundação AIS Internacional com um apelo: “Não se esqueçam de Moçambique”.