As características das sociedades avançadas são o excesso, o desmesurado, a profusão de ofertas, a multiplicidade de possibilidades. Atraídos por mil propagandas, acabamos atordoados e sem capacidade para discernir sobre o essencial. Tudo gira à volta do consumo de bens supérfluos. O critério é comprar para se estar à altura dos amigos e mostrar que somos alguém que triunfou na vida. Os centros comerciais e os hipermercados expõem um sortido incrível de produtos. Os restaurantes apresentam cartas e menus com toda a classe de combinações. Podemos selecionar um número cada vez mais alargado de cadeias de televisão. As agências propõem-nos todo o tipo de viagens e de experiências. A Net abre caminho a um número ilimitado de imagens, contactos, impressões. Dantes, tínhamos uma televisão, um frigorífico. Hoje temos tantos eletrodomésticos que já não sabemos onde os colocar. E roupas? E móveis? Hoje, os indivíduos resumem a sua personalidade na manifesta exibição de uma determinada marca de carro ou de roupa. Se não fosse a crise que se abateu sobre a Europa, continuaríamos a definir a felicidade a partir dos verbos ter, comprar e possuir. Acumular, portanto! A estes verbos juntam-se os que se relacionam com cuidar o corpo, manter-se em forma e sem rugas, não envelhecer. A azáfama reduz-se a descortinar necessidades artificiais. [Há pessoas que só vivem de e para as aparências]. Não temos que nos admirar se muitos contemporâneos nem sequer dão um sentido último à existência. O excesso de informação e a hipersolicitação do consumismo dissolvem a força das convicções. São muitos os que vivem entretidos no anedótico e passageiro, nas prescrições clubísticas e nas imposições partidárias, sem projeto, nem ideal. Quando alguém vive apenas à procura do bem-estar cada dia maior, unicamente interessado em acumular e adquirir símbolos de prestígio, de certeza que já perdeu a capacidade de escutar o que de mais profundo encerra o seu íntimo. E o íntimo encerra a verdade! Nisto tudo há erros, muitos erros. Vou referir três. O primeiro consiste em fazer das necessidades materiais o objetivo absoluto da vida, pensando que a felicidade se encontra na posse e gozo dos bens – quando se sabe que o importante é partilhar em vez de possuir, é dar em vez de amontoar, é criar vida em vez de explorar o próximo. O segundo erro consiste em procurar o poder, o êxito e o triunfo pessoal a todo o custo e a qualquer preço, inclusivamente sendo infiel à própria missão – quando se sabe que a pessoa acerta não quando procura o próprio prestígio, mas quando é capaz de exercer um serviço generoso e desinteressado. O terceiro consiste em tentar resolver o problema último da vida sem riscos nem lutas nem esforços – quando se sabe que não é na passividade nem na evasão nem no absentismo diante dos problemas que se obtêm os méritos para a salvação eterna, mas no arriscar para conseguir um mundo mais digno e justo. De facto, são muitas as ofertas de salvação propostas pela nossa sociedade progressista. Mas são ofertas parciais, redutoras, que não proporcionam tudo aquilo de que o ser humano anda à procura.
Manuel Maria Madureira, diretor