Ao fim de 11 anos de uma guerra que já causou cerca de 500 mil mortos – a data do início do conflito foi assinalada a 15 de Março –, a Síria é hoje um país empobrecido, com mais de 13 milhões de pessoas deslocadas, dentro e fora das fronteiras, com uma taxa de pobreza asfixiante e com cerca de 6,5 milhões de crianças que precisam de ajuda humanitária. Em entrevista em exclusivo à Fundação AIS, a Madre Agnès-Mariam de la Croix, superiora das Monjas de Unidade de Antioquia, e normalmente conhecida apenas como madre Agnès, ajuda a fazer um retrato da Síria, dos seus problemas e desafios. “Posso dizer que esta situação é catastrófica. A sobrevivência torna-se impossível para o nosso povo, sejam cristãos ou não, porque nós, no Mosteiro de São Tiago Mutilado, cuidamos de toda a gente, porque todos são seres humanos criados à imagem de Deus.”

Libanesa, madre Agnès reparte o seu tempo pela Síria e pelo país natal, onde a sua comunidade religiosa desenvolve diversas actividades de apoio às populações. A Síria é hoje um país onde o acesso a bens elementares como o pão, electricidade ou combustíveis está cada vez mais difícil. Mas a Síria é também um país que corre o risco de ficar esquecido numa altura em que o mundo parece estar focado totalmente na guerra na Ucrânia. Para a Madre Agnès é preciso que o mundo não se esqueça da Síria, das suas populações vítimas de uma guerra que parece interminável. “Tem de haver uma solução, tem de haver uma solução internacional para a situação na Síria, mas também uma solução de generosidade humana”, diz a religiosa. “Por isso, esperamos que, tal como a Fundação AIS, outras instituições católicas olhem de mais perto para esta situação desesperada na Síria, para nos ajudar a ajudar e ajudar todos os que estão a ajudar estas pessoas, porque hoje mais de 85% da população síria vive com necessidades. Há 13 milhões que viram as suas casas destruídas, que não têm casa. Consegue ver-se por satélite a situação dessas casas destruídas, principalmente nas grandes cidades.”


“O EMBARGO É INJUSTO”

Numa entrevista gravada no Mosteiro de São Tiago Mutilado, em Qara, a Madre Agnès de la Croix refere com alguma insistência a questão do embargo económico, imposto ao regime de Damasco pelos Estados Unidos da América e também pela União Europeia. Um embargo que está a asfixiar a população. “Este embargo é injusto porque quem paga o preço mais elevado é o cidadão e o cidadão é inocente, não tem nada a ver com as partes beligerantes. Por isso, é muito importante a oração e chamar a atenção para a urgência de uma solução internacional para a resolução deste conflito e para o fim deste embargo.”

A Madre Agnès era carmelita no Líbano quando recebeu um apelo para trabalhar mais de perto pela unidade original da Igreja, dos cristãos e com os judeo-cristãos. E foi assim que nasceu a comunidade na vila de Qara, fundada num antigo mosteiro do séc. VI que se encontrava em ruínas e que foi, entretanto, reconstruído. É desde Qara que a religiosa tem acompanhado também a diminuição crescente e preocupante do número de cristãos na Síria. “Os cristãos sírios estão a ir-se embora, a deixar a Síria, muitas vezes de barco, morrendo pelo caminho e a sua situação é também muito precária nos países para onde vão como refugiados…”


“OS INOCENTES ESTÃO A MORRER”

Encurralados num país que ainda não se conseguiu reerguer da guerra e sem expectativas de um futuro melhor, a emigração acaba por ser uma saída para a situação em que se encontram muitas famílias. A crise económica torna o dia-a-dia asfixiante para a esmagadora maioria dos sírios. “A maior dificuldade prende-se com o poder de compra. Não têm qualquer poder de compra, porque a Libra da Síria já baixou mais de 100 vezes e os ordenados mantêm-se mais ou menos iguais ao que eram. O Governo está cada vez mais pobre e já não consegue dar apoio em gasolina ou produtos alimentares como cereais, trigo, o que aliviaria as pessoas se houvesse algum apoio que não implicasse despesa. É por isso que a situação se torna cada vez mais complicada para essas pessoas. No passado, podiam cultivar a terra, mas agora está tudo tão caro que já não conseguem. Por isso, volto a sublinhar que é fundamental um plano estratégico para apoiar esta população.”

Para a Madre Agnès é essencial olhar para estas populações pois são elas que mais sofrem, são elas as principais vítimas das sanções impostas ao regime de Bashar al-Assad. “São as pessoas inocentes que estão a morrer, a ser expulsas, a sofrer, a pagar o preço, a emigrar… Mais uma vez, rezamos e temos esperança de que os líderes desses países poderosos voltem à razão e à justiça, voltem ao respeito pela lei internacional e deixem de interferir nos destinos dos povos da Síria e nas suas decisões.”


AJUDAR OS CRISTÃOS A FICAR NA TERRA SANTA

É muito importante também, diz a religiosa, ajudar as famílias cristãs a permanecer na sua terra. “O que temos de fazer é ajudar essas famílias a ficar cá. Porque é esse o desejo do Santo Padre, o desejo dos prelados e o desejo de todo o mundo católico. Se o Médio Oriente não tiver a presença dos Cristãos, vamos fazer uma cruzada? Não podemos ficar sem os Cristãos! Então, graças à Fundação AIS e outras instituições católicas podemos procurar ajuda e podemos construir juntos um plano estratégico em que as famílias cristãs sejam formadas para ficar. Têm de ser formadas para ficar porque se lhes dermos esperança e ajudarmos na sua necessidade a tornarem-se autossuficientes, seria muito, muito importante”, diz a madre superiora, lembrando que não é fácil para um cristão assumir a sua fé num contexto tão complexo como o que existe no Médio Oriente. “A nossa realidade é uma realidade difícil. Um cristão no Médio Oriente não é um cristão na Europa ou no mundo ocidental, onde há liberdade de religião. […] Temos esperança de que, de mãos dadas, nos possamos ajudar uns aos outros e ajudar os Cristãos a ficar nesta Terra Santa. Este é um dos objectivos principais da nossa comunidade.”

https://www.youtube.com/embed/U2KPmR-qugo

PA | Departamento de Informação da Fundação AIS |

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