CENTENÁRIO DA ENTRADA DE D. MANUEL MENDES EM ÉVORA
Sé de Évora, 11 de fevereiro de 2022
HOMILIA
Caríssimos Irmãos e Irmãs, a Primeira Leitura retirada do Primeiro Livro dos Reis (1Rs 11, 29-32; 12,19), diz-nos que as acções simbólicas dos profetas são gestos não apenas expressivos, mas também eficazes (cf. Jr 18, 1ss). O profeta Aías, com o gesto que tem, quer tornar mais eficaz o seu oráculo. Os dez pedaços do manto, destinados a Jeroboão, são as dez tribos a ele confiadas, as dez tribos do norte (cf. 2Sm 19,44); os outros dois pedaços designam a tribo de Judá, à qual pertence a casa de David, e a de Benjamin (c. 12,21).
O facto da infidelidade à Aliança provocar o cisma no povo de Deus. A unidade, pouco depois de criada e consolidada desaparece, e tem início uma longa história de desventuras, embora Deus permaneça fiel e venha a realizar de qualquer modo o seu desígnio através dos restos, ainda que muito frágeis, da casa de David.
No Evangelho proclamado (Mc 7, 31-37), o Evangelista Marcos diz-nos que Jesus continua a circular em território estrangeiro, realizando curas. No texto de hoje, temos o caso de um homem surdo, que mal podia falar. O Mestre, sem medo de se contaminar, leva o homem para fora da multidão e toca-o no ouvido e na língua. A surdez impede a pessoa de ouvir e acolher os ensinamentos do mestre; ao passo que a gaguez dificulta o anúncio da Palavra. A sua deficiência mantinha-o fechado em si mesmo e impedia-o de comunicar. Isto pode ser símbolo dos discípulos incapazes de ouvir o Mestre e de serem fiéis anunciadores da sua Palavra. Podemos ver, neste relato, também os oprimidos da sociedade: os que não contam, os ensurdecidos e calados pela opressão. A Igreja libertadora é convidada a ser voz dos que não têm voz. Com a cura, Jesus realiza as mesmas obras de Deus, descritas no livro do Génesis; fez bem todas as coisas.
Parece que nos encontramos perante um conjunto de ritos que levam à libertação, a antecedência da Páscoa Cristã. De facto, Jesus prepara o enfermo pagão para a cura com cerimónias que só podem ser simbólicas: toca-lhe os ouvidos com os dedos e a língua com a sua saliva, ergue os olhos para o céu em atitude de oração, suspira profundamente em atitude de compaixão e ordena em aramaico ao doente que se “abra” à cura. O comentário dos assistentes – extraído de Gn 1 e de Is 35, 5s – dá-nos a chave para compreender o simbolismo, já percebido pela antiga liturgia batismal: o pagão torna-se uma nova criatura mediante a intervenção de Jesus que, no batismo, lhe abre os ouvidos e lhe solta a língua, para que escute, viva e faça ressoar para os outros a Palavra de Deus.
No Ritual da Iniciação Cristã de Adultos, no contexto do Catecumenado em vários degraus, encontramo-nos com o Rito do EPHPHETHA, no qual o celebrante toca com o polegar nos ouvidos e na boca e proclama: «Ephphetha, que quer dizer, abre-te, para professares a fé que ouvistes, em louvor e glória de Deus» (RICA nº 202).
“Abre-te” ordem que foi dirigida a cada um de nós por ocasião do nosso batismo. Por meio desta “cura”, que nos permite abrir-nos para o nosso batismo. Por meio desta “cura”, que nos permite abrir-nos para escutar e proclamar a palavra de Deus, fomos feitos “crentes” e “profetas”. O grande número de cura de surdos, mudos e gagos que se encontra na Bíblia pretende fazer-nos compreender que o profeta é incapaz de falar por si, mas precisa de receber de Outro a palavra que deve transmitir, e também o povo é incapaz de escutar por si só, pelo contrário, muitas vezes fecha os ouvidos. Em inúmeras épocas da história da salvação os profetas foram acometidos pelo mutismo e a palavra não era mais proclamada, porque os ouvidos não estavam abertos para escutar. O mutismo está ligado à falta de fé. Ao invés, quando os profetas falam, é sinal de que Deus está presente, e então a fé é amplamente difundida. Que acontece na Igreja de hoje? E na Igreja particular em que vivo, na comunidade em que me integro? Ouve-se a Palavra? Há coragem para falar de Deus e com Deus?
«Estarei convosco até ao fim dos tempos» (Mt 28,20).
A Sua presença acontece de muitos modos nomeadamente através daqueles que nos concede como Pastores, Profetas e sinais para as nossa vidas.
Eis-nos aqui reunidos na memória de Nossa Senhora de Lurdes para celebrarmos o centenário de um desses sinais de que Deus não abandona o Seu povo.
Foi no dia 11 de fevereiro de 1921, que o Servo de Deus, D. Manuel Mendes da Conceição Santos (13.12.1876 – 30.03.1955) entrou na Sé eborense, assumindo o ministério de Arcebispo Metropolita de Évora. Era Papa Bento XV. Após 34 anos de intenso, dedicado e zeloso serviço à Vinha do Senhor, faleceu com generalizada fama de santidade. O seu lema foi “Sub tuum praesidium”. Trata-se de alguém que foi fiel aos Dons do Espírito Santo, cuja vida fala por si. Tornando-se no dia a dia sacerdote, profeta e pastor.
Na sua biografia encontramo-nos com um conjunto de critérios, realidades e ações verdadeiramente incontornáveis, refiro-me sobretudo aos Seminários de Évora e Vila Viçosa, bem como à procura de vocações por todo o país, aos seus amados Sacerdotes, aos mui desejados Religiosos e Religiosas, à educação e aos Colégios, ao apostolado social e religioso, ao acompanhamento pessoal e epistolar, à obra da catequese e dos retiros, aos adolescentes e jovens com a vinda do Escutismo para a Arquidiocese, à então chamada boa imprensa e sua divulgação, através da Gráfica Eborense e da sua livraria, à liberdade e dignidade da Igreja e sua missão, às dolorosas questões da pobreza, da infância desvalida e a outras causas sociais e assistenciais de extrema urgência, como a “sopa dos pobres” e o atendimento no seu “Paço Arquiepiscopal” de porta sempre aberta, um inacabado Convento Terceiro-Carmelita Regular, gentilmente cedido por uma benemérita família eborense, porém a última esperança para situações de pobreza envergonhada ou situações de lamentável mendicidade.
A 26 de novembro de 1961, o seu sucessor, D. Manuel Trindade Salgueiro (28.09.1898 – 20.09.1965), concedeu o “imprimatur” à Oração pela Beatificação de D. Manuel Mendes, impressa numa pagela onde se incluía já a sua síntese biográfica. Pelos anos 70, um grupo de leigos, acompanhados pelo seu Director Espiritual, solicitaram ao Arcebispo de Évora, D. David de Sousa (1966-1981), que fosse iniciada e introduzida a Causa de Canonização no Dicastério da Causa dos Santos, em Roma. Esse procedimento deu início em 1972 e prossegue na sua exigente organização através da Vice Postulação, com sede em Évora, e da Postulação sediada na Cidade Eterna.
“Ó Jesus, sumo e eterno Sacerdote, Que Vos dignastes elevar ao episcopado o Vosso fiel servo D. Manuel Mendes da Conceição Santos, e lhe concedestes a graça de ser defensor intrépido da Fé, apóstolo zeloso da Esperança, generoso advogado da Caridade, filho devotíssimo da Mãe de Deus e modelo de todas as virtudes pastorais, dignai-Vos, agora, em atenção aos seus merecimentos , conceder-nos todas as graças de que necessitamos e Vos pedimos, para que, plenamente seguros da eficácia da sua intercessão junto de Vós, o possamos contemplar um dia na glória dos altares. Ámen!”
+ Francisco José Senra Coelho
Arcebispo de Évora
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Reveja aqui a Eucaristia:
No dia 11 de Fevereiro de 2022, celebra-se o Encerramento do Centenário da Entrada de D. Manuel Mendes da Conceição Santos na Arquidiocese de Évora.
Numa mensagem dirigida aos arquidiocesanos, D. Francisco José Senra Coelho convida “todos os Sacerdotes, Diáconos, Religiosos e Leigos a participarmos na Eucaristia de Ação de Graças a celebrar na Sé, no próximo dia 11 do corrente mês de Fevereiro, pelas 11 horas, seguida de Romagem ao seu túmulo, nos claustros da Catedral, para uma breve homenagem de memória e gratidão. Pelas 21 horas, viveremos uma Vigília na capela do Seminário de Évora, dedicada a Nossa Senhora da Purificação. Sábado, dia 12, pelas 10 horas, no Auditório Eugénio de Almeida, teremos oportunidade de participar num painel esclarecedor da Vida e Obra do Servo de Deus”.
“Que a família Arquidiocesana saiba beneficiar do testemunho e da intercessão deste Pastor sábio, justo e bom”, sublinha o Prelado Eborense.
Na Mensagem, o Arcebispo de Évora recorda que foi no dia 11 de Fevereiro de 1921, que o Servo de Deus, D. Manuel Mendes da Conceição Santos (13.12.1876 – 30.03.1955) entrou na Sé eborense, assumindo o ministério de Arcebispo Metropolita de Évora. Era Papa Bento XV. Após 34 anos de intenso, dedicado e zeloso serviço à Vinha do Senhor, faleceu com generalizada fama de santidade. O seu lema foi “Sub tuum praesidium”.
D. Francisco José Senra Coelho lembra que em 1972 se deu início ao procedimento da Causa de Canonização no Dicastério da Causa dos Santos em Roma. Procedimento que prossegue “na sua exigente organização através da Vice-Postulação, com sede em Évora, e da Postulação sediada na Cidade Eterna”.
O Arcebispo de Évora sublinha ainda da biografia do Servo de Deus “um conjunto de critérios, realidades e ações verdadeiramente incontornáveis”, destacando: os Seminários de Évora e Vila Viçosa; a procura de vocações por todo o país; a educação e os Colégios; o apostolado social e religioso; o acompanhamento pessoal e epistolar; a obra da catequese e dos retiros; os adolescentes e jovens com a vinda do Escutismo para a Arquidiocese; a boa imprensa e sua divulgação, através da Gráfica Eborense e da sua livraria; a liberdade e dignidade da Igreja e sua missão; “as dolorosas questões da pobreza, da infância desvalida e a outras causas sociais e assistenciais de extrema urgência, como a “sopa dos pobres” e o atendimento no seu “Paço Arquiepiscopal” de porta sempre aberta, um inacabado Convento Terceiro-Carmelita Regular, gentilmente cedido por uma benemérita família eborense, porém a última esperança para situações de pobreza envergonhada ou situações de lamentável mendicidade”.
“São muitos os testemunhos recolhidos junto dos seus coetâneos a testarem as suas virtudes heroicas, o ardor da sua piedade e caridade, a riqueza da sua humanidade e bondade, bem como a profundidade do seu saber e a vasta erudição da sua formação intelectual: Doutor em Teologia e estudos de Línguas Clássicas no Instituto S. Apolinário, em Roma”, refere D. Francisco Senra Coelho.