Neste dia 8 de dezembro, Solenidade da Imaculada Conceição da Virgem Santa Maria, às 17h00, na Catedral de Évora, D. Francisco Senra Coelho preside à Eucaristia solene na qual será ordenado presbítero, o diácono Tiago Neves Carlos.
Recorde-se que Tiago Neves Carlos, de 27 anos de idade, é natural de Elvas e foi ordenado diácono pelo Arcebispo Emérito de Évora, D. José Alves, no Santuário de Nossa Senhora da Conceição, em Vila Viçosa, no dia 6 de junho do corrente ano.
Esta celebração, na Catedral de Évora, será transmitida em direto nos canais digitais da Arquidiocese de Évora.
Acompanhe aqui em directo:
SOLENIDADE DA IMACULADA CONCEIÇÃO
Ordenação do Padre Tiago Neves Carlos
Homilia do Arcebispo de Évora
Com que alegria celebramos em Tempo de Advento a Solenidade da Imaculada Conceição de Nossa Senhora!
Fazemo-lo na contemplação da beleza d’Aquela que nos foi oferecida como Mãe e Ícone da Igreja e de cada Cristão. Fruto de uma compreensão constante do papel de Maria na História da Salvação, o Papa Pio IX, a 8 de dezembro de 1854 definiu solenemente na Bula “Inefabilis Deus” que «a Beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante de sua conceição, por singular graça e privilégio de Deus omnipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do género humano, foi preservada imune de toda a mancha do pecado original (…)».
Refletindo sobre esta definição, o Papa Francisco explicou-nos que «Maria foi preservada do pecado original, isto é. Daquela fratura na comunhão com Deus e com os outros, e com o que foi criado, que fere profundamente todo o ser humano». Para o Santo Padre, esta fratura «foi sanada antecipadamente na Mãe d’Aquele que veio para nos libertar da escravidão do pecado. A Imaculada está inscrita no desígnio de Deus; é fruto do Amor de Deus que Salva o mundo». O Papa lembra-nos que Maria, proveniente de Nazaré, pequena localidade da Galileia, na periferia de Israel e ainda mais do Império Romano, nunca se distanciou do Amor de Deus, toda a sua vida e todo o seu Ser é um SIM a esse Amor, é um SIM a Deus. Recorda-nos o Bispo de Roma, que «também nós, desde sempre, fomos escolhidos por Deus para viver uma vida santa, livre do pecado. É um projeto do Amor que Deus renova cada vez que nos aproximamos d’Ele, especialmente nos Sacramentos.»
Assim, «contemplando a beleza da nossa Mãe Imaculada, reconhecemos também a nossa vocação mais autêntica e profunda: sermos amados, sermos transformados pelo Amor, sermos tocados e transformados pela beleza de Deus. Deixemo-nos por isso, guardar por ela, para aprendermos a ser mais humildes, e também mais corajosos no seguimento da Palavra de Deus; para colhermos o terno abraço do Seu Filho Jesus, um abraço que nos dá vida, esperança e paz».
O Livro do Génesis, relata-nos a rutura da relação transparente de Deus com a Humanidade, representada em Adão e Eva. Nesta metáfora está representada a sede que a humanidade, constantemente revela, de ocupar o lugar de Deus na criação, de assumir o controlo total do mundo e de dominar o seu próprio destino. Neste contexto bíblico, anuncia-se a vitória de uma Mulher que frequentemente os Padres da Igreja identificam com a Igreja e com Maria. A Mulher é apresentada e é pré-anunciada como a nova Eva, aquela que será a Mãe do Redentor, Aquele que virá repor toda a criação na fidelidade ao projeto original de Deus, no dizer de Santo Irineu de Lion, recapitula todas as coisas em Deus.
Esta profecia vetro-testamentária cumpre-se em Nazaré. Longe dos olhares humanos. Maria é proclamada cheia de Graça. Ao aceitar a Palavra de Deus, Ela dispõe-se a trazer a salvação de Deus no meio dos homens, o Emanuel.
Deus não impõe, mas propõe, como fez com a Virgem de Nazaré. Se n’Ela, Deus quis precisar do seu SIM para que o Verbo de Deus, se formasse e se fizesse homem, Jesus Cristo nascendo como Redentor de todo o Homem e do Homem todo, hoje, a caminho do Natal, a Palavra do Senhor convida-nos a deixarmos que essa mesma Palavra gere Jesus nos nossos corações e nas nossas vidas para que, como discípulos missionários, O possamos anunciar, testemunhar e transmitir, para salvação de muitos e de muitas. Eis o apelo: deixar que Cristo se forme em nós para que sejamos discípulos missionários, com testemunhos de vida contagiantes, sempre na Alegria do Evangelho. «Grande maravilha fez por nós o Senhor, por isso, exultamos de alegria!».
O que é singular em Maria tem validade e, sobretudo, luminosidade para a globalidade da Igreja, O que Maria foi é o que a Igreja é convidada a ser continuamente. Para Cristo, Maria é a segunda Eva, aquela que restaura, pela sua obediência, o que a primeira havia corrompido pela sua desobediência; assim, ela é a verdadeira auxiliar da obra salvífica de Cristo e o “recetáculo” da Igreja, como lembra Santo Ambrósio.
Na segunda leitura, o Apóstolo Paulo proclama aos Efésios a sua vocação à Santidade, enquanto Filhos de Deus, herdeiros da Eternidade e Pedras Vivas da Igreja de Cristo. A nossa vocação batismal insere-nos na Igreja e faz de cada um de nós membros vivos do Povo de Deus. A eclesialidade é uma referência incontornável para os discípulos missionários: «Não pode ter Deus por Pai, quem não tiver a Igreja por Mãe» ensina S. Cipriano de Cartágo.
Quem quiser encontrar um modelo para a sua vivência eclesial tem em Maria a referência maior e o auxílio supremo. É que Maria pertence à Igreja, verdade que nem sempre parece ser valorizada. Ela faz parte do mesmo povo que nós. É o membro mais eminente da Igreja, mas não está fora dela ela é connosco.
Neste dia 8 de dezembro conclui-se também o Ano de S. José. Um especial tempo que foi convocado pelo Papa Francisco em 2020 com a Carta Apostólica “Patris corde”, nos 150 anos da declaração de S. José como padroeiro da Igreja universal, feita pelo Papa Pio IX.
“Com o coração de pai: assim José amou a Jesus – é desta forma que Francisco inicia a sua Carta sobre S. José num documento que sublinha várias dimensões da paternidade de S. José, tais como, a ternura, a obediência, o acolhimento, a coragem criativa e também a sua missão como trabalhador.
Para o papa, S. José “nunca se colocou a si mesmo no centro” soube descentralizar-se, colocar Maria e Jesus no centro da sua vida”.
“A felicidade de José não se situa na lógica do sacrifício de si mesmo, mas na lógica do dom de si mesmo. Naquele homem nunca se nota frustração, mas apenas confiança. O mundo precisa de pais, rejeita os dominadores, isto é, rejeita aqueles que confundem autoridade com autoritarismo, serviço com servilismo, confronto com opressão, caridade com assistencialismo, força com destruição. Toda a verdadeira vocação nasce do dom de si mesmo que é maturação do simples sacrifício.
Mesmo no sacerdócio e na vida consagrada, requer-se este género de maturidade. Quando uma vocação matrimonial, celibatária ou virginal não chega à maturação do dom de si mesmo, detendo-se apenas na lógica do sacrifício, então, em vez de significar a beleza e a alegria do amor, corre o risco de exprimir infelicidade, tristeza e frustração.
Caro Diácono Tiago Neves Carlos, neste dia luminoso da tua vida, trago-te à memória o que nos diz a Exortação Apostólica pós-Sinodal Pastores dabo vodis (nº 15), tão marcante que foi e continua a ser: «Este é o modo típico e próprio pelo qual os ministros ordenados (nos graus episcopal e presbiteral) participam do único sacerdócio de Cristo. O Espírito Santo, mediante a unção sacerdotal da Ordem, configura-os, por um título novo e específico, a Jesus Cabeça e Pastor, confirma-os e anima-os com a sua caridade pastoral e coloca-os na Igreja na condição de servidores do anúncio do Evangelho a toda a criatura e da plenitude da vida cristã para todos os batizados».
Caros padres, faz-nos bem retomar este trecho dirigido à vida e ao ânimo de cada um de nós. Não são critérios funcionais do mundo, são razões de ser, que hão-de passar por nós e nos definem.
O Santo Padre no discurso de Advento à Cúria Romana a 22 de dezembro de 2014, apresentou várias doenças de que podemos enfermar em nosso ministério ordenado, bem como todos os discípulos de Cristo, no seu viver quotidiano. Em tempo de reflexão sinodal acolhamos estas interpelações.
Doença de sentir-se “Imortal”, “Imune” ou até mesmo “indispensável”. Esta doença deriva muitas vezes da patologia do poder, do complexo do “eleito” do narcisismo que fixa apaixonadamente a sua imagem e não vê a imagem de Deus impressa principalmente nos mais fracos e necessitados.
Outra doença “martalismo” (que vem de Marta), da excessiva operosidade, daqueles que mergulham no trabalho, descuidando a “melhor parte”.
Ou daquela doença em que é tudo tão programado que nem espaço dá ao Espírito Santo. Será que os outros não podem ter uma palavra a dizer?
A doença da rivalidade e da vanglória. Quando a aparência, as cores das vestes e as insígnias de honra se tornam objetivo primordial da vida.
A doença da indiferença para com os outros. Quando alguém pensa somente em si mesmo e perde a sinceridade e o calor das relações humanas.
A doença do acumular: quando o apóstolo procura o ter esquecendo o ser.
Perante estas interpelações, convido-vos a olharmos com os olhos do coração para S. José, a fim de que o seu coração de Pai inspire o nosso coração de pastores atentos, disponíveis e generosos:
Ensina-nos, José como se é não protagonista, como se avança sem pisar, como se colabora sem impor. Como se ama sem exigir.
Diz-nos José como se vive sendo o número dois, como se fazem coisas importantes a partir do segundo lugar.
Explica-nos José como se é grande sem se exibir, como se luta sem aplauso, como se avança sem publicidade, como se preserva e se morre sem esperar homenagem.
Caro Diácono Tiago Neves Carlos, Irmãos e Irmãs, a eucaristia será antidoto contra o Homem Velho e alimento para o Homem Novo.
João Paulo II testemunha que «a Igreja vive da Eucaristia. Esta verdade não exprime apenas uma vivência diária de fé, mas contém em síntese o próprio núcleo do mistério da Igreja. É com alegria que ela experimenta, de diversas maneiras, a realização incessante desta promessa: “Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo” (Mt 28, 20); mas, na Sagrada Eucaristia, pela conversão do pão e do vinho no corpo e sangue do Senhor, goza desta presença com uma intensidade sem par». Eis o nosso alimento, eis a nossa dádiva.
Rezamos com o Papa Francisco:
«S. José, tu que guardastes a ligação com Maria e Jesus, ajuda-nos a cuidar das relações ma nossa vida.
Que ninguém experimente o sentimento de abandono que vem da solidão.
Que cada um de nós se reconcilie com a própria história, com aqueles que nos precederam, e reconheça inclusive nos erros cometidos um modo pela qual a Providência abriu o seu caminho, porque o mal não teve a última palavra.
Mostra-te amigo para aqueles que mais lutam, e como apoiaste Maria e Jesus nos momentos difíceis, apoia-nos também a nós no nosso caminho. Ámen».
+ Francisco José Senra Coelho
Arcebispo de Évora