Homilia da Missa Exequial do Cónego Salvador Dias Terra

03-08-2021

Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor Dom José Francisco Sanches Alves, Arcebispo Emérito de Évora.

Excelentíssima família e amigos do nosso tão estimado Cónego Salvador Dias Terra.

Reverendos Senhores Padres José Henriques, digníssimo Reitor de Avanca, e Reverendo Padre Manuel, Vigário paroquial desta comunidade.

Reverendo Cónego Manuel Ferreira, representante do Cabido Metropolitano e do Seminário Maior de Évora.

Reverendos presbíteros, filhos de Avanca, conterrâneos do nosso saudoso Cónego Salvador Dias Terra, Reverendíssimos Cónegos Henrique Guimarães e Mário Tavares de Oliveira.

Reverendos presbíteros da Diocese de Aveiro e Arquidiocese de Évora, hoje irmanados no mesmo sentimento perante o falecimento do nosso irmão Cónego Salvador, que connosco participou no único e eterno sacerdócio, em Nosso Senhor Jesus Cristo.

Estimados paroquianos de Avanca e nossos irmãos.

Inicio esta homilia apresentando à distinta família do nosso querido Cónego Salvador a nossa gratidão, pelo dom da sua vida, da sua vocação e do seu ministério, com as quais indelevelmente permaneceis ligados; e convosco louvamos o Senhor pelo dom dos queridos pais que ofereceram com generosidade e enorme gratidão a Deus e total desprendimento o seu amado filho à terra do Alentejo e Ribatejo, da nossa Arquidiocese de Évora.

Obrigado aos párocos desta comunidade pelo modo como nos recebem e acolhem, fazendo acontecer aqui uma verdadeira experiência de Dioceses irmãs, de uma só Igreja.

Obrigado ao povo, à família de Avanca, pela oração elevada ao belo e bom Pastor, à vida sacerdotal, missionária e religiosa, que também beneficiaram a nossa Arquidiocese, como terra missionária.

Foi no dia 17 de dezembro de 1934 que nesta freguesia de Avanca, Distrito de Aveiro, nasceu Salvador Dias Terra. Seus pais, Salvador da Silva Terra e Maria Beatriz Dias, procuraram predispor o seu coração para que se tornasse boa terra, capaz de receber a semente da Palavra de Deus e produzir cem por cento. Ao manifestar a sua vocação sacerdotal em tenra e pueril idade, os seus pais, com a ajuda do Senhor Reitor, levaram-no a frequentar os três primeiros anos preparatórios no Seminário de Aveiro, prosseguindo a restante caminhada no Seminário de Évora. Foi ordenado presbítero a 28 do mês de junho de 1959, por sua Excelência Reverendíssima, Senhor Dom Manuel Trindade Salgueiro, na Sé de Évora, ficando ao serviço da Diocese de Évora, celebrou missa nova a 29 do mês de junho do mesmo ano, em Fátima. A 3 de outubro de 1959 foi nomeado Prefeito e professor do Seminário de Vila Viçosa; a 23 de setembro de 1963 foi nomeado Prefeito do Seminário Maior de Évora; a 12 de setembro de 1964 foi nomeado Diretor Espiritual do Seminário de Vila Viçosa; a 25 de janeiro de 1971 foi nomeado Diretor Espiritual do Seminário Maior de Évora; a 14 de setembro de 1976 foi nomeado Vice-Reitor do Seminário de Évora; a 24 de setembro de 1981 foi nomeado para Diretor do Departamento de Catequese e Promoção Vocacional; a 19 de março de 1981, Festa de São José, o saudoso Arcebispo Franciscano, D. Frei David de Sousa, nomeou-o Cónego Metropolitano da Sé de Évora; Para além das funções que desempenhava no Seminário Maior de Évora, a 20 de setembro de 1982, foi nomeado Vigário Ecónomo de São Brás de Évora; a 28 de novembro de 1983, foi nomeado assistente religioso do Estabelecimento Prisional Regional de Évora; a 7 de outubro de 1984 foi reconduzido no ministério de Diretor do Departamento de Pastoral das Vocações, por um período de 5 anos; a 1 de janeiro de 1987 foi nomeado, por um período de 5 anos, Ecónomo da Arquidiocese e Presidente do Instituto Diocesano Eborense; a 15 de agosto de 1996 inicia-se a sua segunda etapa de vida, aos 62 anos, recebendo a nomeação de pároco de Torrão e Alcáçovas; a 15 de agosto de 2001 é nomeado pároco in solidum com o padre Elias Serrano Martins, das paróquias de Coruche; São João Baptista; Nossa Senhora do Castelo; Azervadinha; Erra; Fajarda; Lamarosa e Rebocho; Já com reduzida força, no ano 2008, regressa a Évora para viver na Casa Sacerdotal do Pólo da Quinta de Santo António. Apesar de se adivinhar a marca de um cansaço limitador, assumiu generosamente, a partir de 31 de julho, a responsabilidade de capelão da Sé de Évora, celebrando às 8h da manhã a primeira missa ferial da cidade.

Ao concentrar-me neste momento celebrativo que estamos a viver, revi o álbum de memória de muitos momentos em conjunto com o nosso amigo Cónego Salvador e pensei neste texto evangélico, que nos pode ajudar a viver em comunhão a celebração destas exéquias. Não sendo um texto evangélico retirado do lecionário das exéquias, este parece-me apropriado para o momento. O Evangelho de Lucas (10, 17-24) poderá trazer até nós, pregadores, que fazem trilho e deixam marcas em muitas vidas e corações, novos dinamismos de esperança. «Felizes são os pés do mensageiro da paz!» (cf. Is 52, 7), felizes aqueles que receberam, do nosso irmão, Cónego Salvador, o anúncio da palavra libertadora e a celebração da misericórdia do Senhor.

Conta-se, nessa passagem, que Jesus enviou setenta e dois discípulos a anunciar o seu Evangelho. Regressaram alegres e felizes, quais jovens repletos de histórias para narrar. Contaram experiências que os marcaram. Jesus ouviu tudo e confirmou as maravilhas que o Pai operou através deles, de cada um deles, da unidade de todos eles.

Depois, acrescentou: “Não vos alegreis pelo facto de nada ter resistido à vossa palavra; alegrai-vos, antes, porque os vossos nomes estão escritos nos Céus.” (cf. Lc 10, 20) Como sabemos, a expressão «céus» significa Deus transcendente e inefável. A catequese de Jesus pode significar: alegrai-vos porque a vossa vida está inscrita para sempre no coração de Deus e ninguém vos poderá arrancar desse Amor. Sois eternamente amados.

Nesse mesmo instante, sob a ação do Espírito Santo, Jesus exultou de alegria e rezou: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelaste aos pequeninos» (cf. Lc 10, 21) […] Voltando-se, depois, para os discípulos, disse-lhes em particular: «Felizes os olhos que veem o que estais a ver. Porque – digo-vos – muitos profetas e reis quiseram ver o que vedes e não o viram, ouvir o que ouvis e não o ouviram!» (Lc 10, 23-24).

Pela história do nosso Cónego Salvador, bem podemos concluir que a vida humana é uma evolução contínua. Se a morte fosse a última palavra, a pessoa humana estaria a evoluir para o nada. Jesus tem outra maneira de ver esta realidade: a alegria da fé consiste em acreditar que a personalidade de cada um de nós está inscrita no coração de Deus. A morte não poderá vencer este amor eterno.

Para nós, é este o coração da revelação cristã, como afirma um teólogo contemporâneo: “Não temos que nos preocupar como será a vida do Além, a vida depois da vida que conhecemos. Não temos nem a geografia nem o calendário nem a configuração daquilo que se evoca com a palavra céu. Todas as evocações ou descrições são, apenas, tentativas de preencher a nossa ignorância, transpondo, para o Além, o que há de melhor (o céu) e o que há de pior (inferno) neste mundo. É certo que há música e pintura que procuram evocar o estado daqueles que já se encontram na alegria de Deus, mas mesmo as evocações mais poéticas serão sempre a miséria que se pode arranjar para não ficarmos mudos e cegos. Se é permitido dizer alguma coisa, talvez seja melhor dizer que o céu é o encontro, a descoberto, com a infinita juventude de Deus recriadora da nossa vida à imagem da sua alegria (…) Só nos é possível fazer esta celebração porque acreditamos que o Crucificado vive para sempre transfigurado na eterna juventude de Deus, está sempre connosco e foi o primeiro a chegar a esta celebração. É porque Ele celebra connosco que trouxe em companhia os que a morte nos roubou e também vieram transfigurados rezar connosco. É isto a comunhão dos santos. Ao comungar o Cristo ressuscitado, comungamos todo o seu corpo místico. A bem dizer, não celebramos pelos mortos – se estivessem mortos não valia a pena – nem pela «alma» dos mortos. Evocamos a presença viva, misteriosa, da personalidade de cada um que não pode ser confundida com os restos mortais que enterramos ou cremamos.”

Como Job, o Cónego Salvador experimentou dias de sol e dias de sal, donde distinguimos a vontade de Deus na sua vida e o caminho para a seguir. Por isso, proclamou mesmo com o seu silêncio: “Eu sei que o meu Redentor está vivo e eu mesmo o verei com os meus olhos.” (cf. Job 19, 25) De facto, esta luz que o guiou e lhe deu a bússola da sabedoria, que o aconselhou e ancorou, essa mesma luz que tantas vezes lhe mostrou a Esperança, está aqui no seu sorriso que não morre. As suas mãos calejadas de quem sempre serviu e ceifou nas vinhas e nas searas do Senhor.

Obrigado, Cónego Salvador, nosso irmão no ministério ordenado. Bendito seja Deus por ti e pela tua vida sempre marcada pelo sim de Maria.

Paz à sua alma.

+ Francisco José Senra Coelho

Arcebispo de Évora

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